O trabalho de Ozlem Tureci, co-fundadora da BioNTech, foi interrompido no final de 2019 com notícias do surgimento de um novo vírus na China. Imediatamente pensaram que a tecnologia em que trabalhavam há mais de duas décadas podia ser uma solução.
Chamaram-lhe Projeto Lightspeed, ou velocidade da luz, e em menos de um ano viam o Reino Unido aprovar a sua vacina, desenvolvida em colaboração com a Pfizer. Foi a primeira grande esperança na luta contra a Covid-19.
Hoje, as suas atenções voltam-se para o trabalho que foi colocado em pausa: a procura de um mecanismo que permite aos nossos sistemas imunitários combaterem os tumores cancerígenos.
A fama da BioNTech cresceu e permitiu angariar mais fundos para as investigações que possam ajudar a criar uma nova ferramenta para a luta contra o cancro. E essa luta assenta na tal tecnologia revolucionária que usa o ARN mensageiro. Da mesma forma que ele é usado para educar o corpo a combater o vírus, o mesmo pode ser feito no cancro.
“Temos várias vacinas distintas para o cancro, todas baseadas no mRNA”, revela Tureci à “Associated Press”, embora tenha dificuldade em dizer quando é que elas poderão estar disponíveis. “É complicado fazer previsões neste tipo de desenvolvimentos inovadores. Esperamos precisar apenas de alguns anos para que consigamos fornecer as vacinas às pessoas.”
O uso do mRNA na luta contra o cancro não é propriamente uma novidade. A investigação avança, os estudos também e há até casos de sucesso em terapias experimentais.
O norte-americano de 52 anos, Brad Kremer, foi um dos doentes tratados com uma vacina experimental em 2019. Afetado por um cancro da pele que se havia metastizado, recebeu a injeção e os primeiros efeitos positivos tornaram-se literalmente visíveis ao fim de algumas semanas, revela a revista científica “Nature”.
As pequenas manchas que tinha na pele começaram a perder a cor. “Estava a ver as células cancerígenas a encolher com os meus próprios olhos”, disse. As sucessivas doses fizeram o cancro retroceder com sucesso.
O uso da tecnologia mRNA tem outras vantagens: é potente, versátil, de produção rápida e é também uma solução de baixo custo.
Diz a “Nature” que em 2017, a BioNTech aplicou esta imunoterapia personalizada — isto é, feita de acordo com o perfil genético de cada um — a 13 casos de doentes com melanoma em estado avançado. Em todos os casos foi possível assistir uma maior imunidade contra os tumores, o que diminuiu o risco do surgimento de metástases.
É a mesma tecnologia usada pela Moderna na sua própria vacina contra a Covid-19 — uma das mais bem-sucedidas startups dos últimos anos —, empresa que foi criada especialmente para desenvolver soluções com base no mRNA. E a sua aplicação está também focada na luta contra o cancro.
Não é tudo. Em cima da mesa estão dezenas de outras aplicações: para combater doenças infecciosas como a Covid-19, mas também a gripe; ou até mesmo uma forma de eliminar as alergias mais comuns.
in nit.pt